Passado o carnaval e depois da euforia, começa a Quaresma. No passado, este período até à Páscoa era vivido duma forma respeitosa. Os mais velhos levavam muito a sério esta época e procuravam passar para os mais jovens a tradição que já os seus progenitores lhes haviam passado. Não havia bailes nem demonstrações de alegria… Optava-se então por jogos tradicionais, feitos ao ar livre e de forma interactiva.
Vou apenas citar um dos jogos e algumas tradições.
O Jogo da Pucarinha
Para se jogar este jogo, era preciso comprar duas ou três pucarinhas de barro, daquelas onde na altura as pessoas guardavam água para ficar mais fresca.
Depois de adquiridas, dava-se início ao jogo.
Todas em fila, as raparigas (sim, porque na altura não havia misturas!) atiravam da frente para trás a pucarinha que, não raras vezes, caía no chão ficando feita em bocados. Quando isso acontecia, lá ia um elemento do grupo a correr à loja do senhor Tó Pinto, agora do Paulinho, buscar mais uma pucarinha. Era assim que, contrariando um pouco a tradição, aquele grupo corria alegremente a aldeia do cimo ao fundo, com cacos e gargalhadas à mistura. Eu, ainda muito jovem, seguia de olhos arregalados aquilo que para mim era uma habilidade impossível de concretizar.
Algumas tradições
Outro tipo de tradição era a relacionada com a alimentação. Durante as sete semanas, e por imposição da Igreja, toda a gente deveria jejuar – isto é, não comer carne – todas as quartas e sextas-feiras, o que se traduzia em algum sacrifício, pelo menos para quem andava no campo em trabalhos que exigiam força física.
Na Semana dos Ramos, e imediatamente a seguir à missa festiva, em que toda a gente levava um ramo para ser abençoado, a tradição também se impunha. Era ver as donas de casa a pôr na rua tudo o que existia em casa, para ser lavado e esfregado até brilhar. Isto acontecia porque era preciso que tudo estivesse bem limpo e cheiroso para receber a visita do pároco na segunda-feira a seguir ao Dia de Páscoa. Nesse dia, ele deslocava-se a todas as casas para dar as Boas-Festas e recolher as ofertas que os paroquianos lhe davam. Com ele seguiam o sacristão da igreja e muitas crianças entusiasmadas, que ajudavam a transportar tudo o que fora angariado. Assim, esta segunda-feira de Páscoa era transformada num dia ainda mais alegre do que o próprio dia de Páscoa.
As cacadas
Outra tradição que contrariava também o espírito da quaresma, por ser muito engraçada,
eram «as cacadas». Pela calada da noite, e quando todas as famílias se encontravam a cear depois de um dia de trabalho árduo, no meio do silêncio, ouvia-se um estrondo. Isso não só assustava as pessoas como os punha a todos em pé de guerra, à procura de quem tinha provocado todo aquele desassossego. Enquanto isso, o autor ou os autores (às vezes era um grupo) fugiam a sete pés para não serem reconhecidos, o que às vezes era difícil. Aos donos da casa, para lá de acharem muita piada, restava-lhes limpar os cacos que tinham sido lançados dentro dum cântaro, dum cesto ou dum garrafão, tanto fazia, e que ficavam espalhados pela casa, ou pelas escadas… E quando elas eram de madeira, que grande festival! A barulheira era mais que muita!
Era assim. As tradições eram seguidas com alegria e com respeito.
Por isso, manifesto com satisfação o meu apoio às iniciativas que começam a acontecer no Casteleiro. Só espero que os jovens participem com vontade de mergulhar e de tomar conhecimento do que foi a vivência dos seus avós.
Bom trabalho.
Vou apenas citar um dos jogos e algumas tradições.
O Jogo da Pucarinha
Para se jogar este jogo, era preciso comprar duas ou três pucarinhas de barro, daquelas onde na altura as pessoas guardavam água para ficar mais fresca.
Depois de adquiridas, dava-se início ao jogo.
Todas em fila, as raparigas (sim, porque na altura não havia misturas!) atiravam da frente para trás a pucarinha que, não raras vezes, caía no chão ficando feita em bocados. Quando isso acontecia, lá ia um elemento do grupo a correr à loja do senhor Tó Pinto, agora do Paulinho, buscar mais uma pucarinha. Era assim que, contrariando um pouco a tradição, aquele grupo corria alegremente a aldeia do cimo ao fundo, com cacos e gargalhadas à mistura. Eu, ainda muito jovem, seguia de olhos arregalados aquilo que para mim era uma habilidade impossível de concretizar.
Algumas tradições
Outro tipo de tradição era a relacionada com a alimentação. Durante as sete semanas, e por imposição da Igreja, toda a gente deveria jejuar – isto é, não comer carne – todas as quartas e sextas-feiras, o que se traduzia em algum sacrifício, pelo menos para quem andava no campo em trabalhos que exigiam força física.
Na Semana dos Ramos, e imediatamente a seguir à missa festiva, em que toda a gente levava um ramo para ser abençoado, a tradição também se impunha. Era ver as donas de casa a pôr na rua tudo o que existia em casa, para ser lavado e esfregado até brilhar. Isto acontecia porque era preciso que tudo estivesse bem limpo e cheiroso para receber a visita do pároco na segunda-feira a seguir ao Dia de Páscoa. Nesse dia, ele deslocava-se a todas as casas para dar as Boas-Festas e recolher as ofertas que os paroquianos lhe davam. Com ele seguiam o sacristão da igreja e muitas crianças entusiasmadas, que ajudavam a transportar tudo o que fora angariado. Assim, esta segunda-feira de Páscoa era transformada num dia ainda mais alegre do que o próprio dia de Páscoa.
As cacadas
Outra tradição que contrariava também o espírito da quaresma, por ser muito engraçada,
eram «as cacadas». Pela calada da noite, e quando todas as famílias se encontravam a cear depois de um dia de trabalho árduo, no meio do silêncio, ouvia-se um estrondo. Isso não só assustava as pessoas como os punha a todos em pé de guerra, à procura de quem tinha provocado todo aquele desassossego. Enquanto isso, o autor ou os autores (às vezes era um grupo) fugiam a sete pés para não serem reconhecidos, o que às vezes era difícil. Aos donos da casa, para lá de acharem muita piada, restava-lhes limpar os cacos que tinham sido lançados dentro dum cântaro, dum cesto ou dum garrafão, tanto fazia, e que ficavam espalhados pela casa, ou pelas escadas… E quando elas eram de madeira, que grande festival! A barulheira era mais que muita!
Era assim. As tradições eram seguidas com alegria e com respeito.
Por isso, manifesto com satisfação o meu apoio às iniciativas que começam a acontecer no Casteleiro. Só espero que os jovens participem com vontade de mergulhar e de tomar conhecimento do que foi a vivência dos seus avós.
Bom trabalho.
Texto de autoria de Maria Dulce Martins
Ainda bem que viram até nós as cacadas e mais umas quantas tradições, cá da nossa terra.
ResponderEliminarRevivê-las è importante, fazer o seu registo escrito não é menos, pois é sempre uma forma de as preservar.
Queria acrescentar um pequeno pormenor à questão das cacadas: "é que as cantarinhas, na maior parte das vezes eram cântaros velhos, que já não serviam, por estarem degradados ou mesmo semi-partidos.
Parabéns pelo pos, desconhecia por complete essa tradição, bem me parecia que seriam usados as cantarinhas velhas, caso contrário não ganhariam para elas.
ResponderEliminarSeria interessante continuar este levantamento de jogos tradicionais e em parceria com associação de jogos tradicionais da guarda fazer uma tarde lúdica pondo em prática esses mesmo jogos e tradições.
Boa semana
Quanto à preservação, sim: acho que é fundamental fazer este esforço, sobretudo da parte de quem ainda se lembra das coisas.
ResponderEliminarQuanto aos cântaros etc. usados nas «caçadas», sim, é verdade que eram velhos. Mas não se passa o mesmo com as cantarinhas usadas no «jogo da pucarinha»: essas eram compradas para este efeito e eram baratas. Iam-se mesmo buscar à loja que agora é do Paulinho. Podem ter a certeza de que era assim.
E obrigada pelo incentivo.
Assim outras pessoas ajudem na recolha.
Maria Dulce Martins