20/04/2014

Alguitarra

“Não só de pão vive o homem…mas também de uma boa aguardente feita na tradicional alguitarra, acompanhada de um belo figo seco ”.
Esta frase era frequente ouvir-se na tradicional taberna do ti Zé da velha (assim conhecida por todo o povo, sem que o próprio se aborrecesse com tal forma de tratamento). Ali, entre um copo e uma bela cartada, falava-se de tudo um pouco.



Apesar das vindimas já irem longe e o vinho novo ir minguando nas adegas quase desertas, hoje trago à vossa lembrança o tradicional fabrico da aguardente, por terras do Casteleiro.
Tão normal como fazer o vinho, era o fabrico de aguardente no alambique de cobre (aqui chamado de alguitarra), do tempo dos nossos avós. E, porque eram poucas as pessoas que tinham a sua própria alguitarra, era muito frequente cobrar por se fazer aguardente no alguitarra alugada. Este pagamento, por vezes, era feito através de dias de trabalho a prestar em terras do proprietário, servindo assim, como moeda de troca pela utilização deste utensílio de cobre, ou então um favor que ficava sempre por pagar…
O alambique ficava no pátio de uma casa, à medida que os moradores combinavam os dias ou as noites para fazer a aguardente. Normalmente optava-se pelo tempo chuvoso para, à volta de um bom lume, indispensável a uma boa destilação, se atiçarem conversas, molhadas com um belo vinho, acompanhado de uma bela assadura, ofertada pelo dono da aguardente que haveria de sair deste popular instrumento.
Para uma boa destilação, é necessário manter sempre o mesmo corrimento, pois o lume que arde e dá o calor deve ser mantido mais ou menos constante, com boas brasas e sem chama. Se escorrer demasiado, passa-se um pano molhado à volta do pote. Se não deitar o suficiente mete-se mais lenha, usando sempre este método até sair fraca.
A prova é feita com um copo pequeno: se é saborosa, se é forte ou fraca...mas ao lançar-se um pouco dela às brasas, se as incendiar, fazendo chama, é sinal de estar forte... 
A primeira aguardente retirada, cerca de 2 jarras, parece água destilada, e só à medida que decorre a fervura vai sendo cada vez mais forte, no fim, já sai mais fraca. Era também normal misturar (caldear) a aguardente mais forte com a mais fraca.
Ao que nos dizem, hoje em dia, é muito perigoso fazer-se a aguardente desta maneira, tão rica e tão popular…É proibido!...Falta o controlo de qualidade…Falta a certificação…Falta o cartão de produtor…Falta o registo das Finanças…Falta…Falta…
Falta valorizarmos o que é nosso.
Quantos produtos genuinamente nossos, se vão continuar a perder por este mesmo motivo?
É PENA!
Deixo aqui o meu protesto!






"A Minha Rua", Joaquim Luís Gouveia


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